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Kassandra, Versos do Silêncio e da Loucura é uma graphic novel de Roger Monteiro baseada no curta­metragem Kassandra, do diretor Ulisses da Motta Costa. As duas obras compartilham os pontos chave de sua narrativa, embora ambas nos ofereçam perspectivas diferentes a respeito de uma mesma história.

Assim como no filme, Kassandra é uma garota com graves distúrbios psiquiátricos, ocasionados por um trauma obscuro do passado, que a colocou em um estado de mutismo e retraimento social, com notas de agorafobia. Seu mundo parece ser o apartamento enorme, povoado de lembranças, em que ela vive sozinha, procurando se abster do convívio com outras pessoas, que considera hostil e doloroso. Mesmo assim, algumas presenças insistem em se impor ao seu retiro, presenças essas que, em diferentes níveis, afetam ainda mais o seu estado de espírito. Obrigada a lidar com os métodos pouco ortodoxos de um terapêuta manipulador e com os arroubos sexuais de um vizinho de índole exibicionismo, Kassandra ainda se vê constantemente acossada por uma figura que transita entre o delírio e a assombração, a quem ela costuma se referir como Homem Grande.

Se no curta­metragem a condição de mutismo de Kassandra nos leva a um contexto de silêncio opressivo e angustiante, na graphic novel uma nova dimensão de compreensão da personagem se abre, quando Roger nos dá acesso aos seus pensamentos, que se manifestam em forma de versos, num contraponto verborrágico ao caráter lacônico do filme. Isso permite que essa Kassandra, dos quadrinhos, compartilhe melhor a sua história, ou pelo menos o seu ponto de vista da história, o que acaba clarificando algumas lacunas do roteiro original ­ também de autoria de Roger Monteiro. Entretanto, como o universo da personagem parece se sustentar apenas pela contradição e pelo mistério, enquanto algumas perguntas são respondidas, outras vão surgindo, tecendo uma estrutura quase labiríntica em que a narrativa linear é uma mera aparência.

Kassandra, Versos do Silêncio e da Loucura apresenta texto e arte de Roger Monteiro.

Para construir as imagens doentias que habitam a mente de Kassandra, o autor executou uma infinidade de intervenções gráficas sobre os frames originais do filme, puxando a estética original, do preto e branco, para uma paleta de cores entre o onírico e o lisérgico, um universo em que aquilo que é visto está sujeito, o tempo todo, a diferentes graus de distorção, variáveis de acordo com o estado mental da personagem. Isso traz para dentro da narrativa um caráter de instabilidade, em que nenhum dos personagens que surge em cena possui uma forma completamente cristalizada, mas se mostra de modo cambiante, ora amigável, ora indiferente, ora monstruoso.

O lançamento da graphic novel ocorre no dia 5 de novembro, inserido na programação oficial da Sala P. F. Gastal, da Usina do Gasômetro, para a próxima edição da Feira do Livro de Porto Alegre. Na ocasião, acontecerá, ainda, uma sessão de Kassandra, com a presença da equipe e de parte do elenco. O evento tem o apoio da Cervejaria Coruja.

 

 

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Duas séries inéditas de Anete Ring estarão no Stand da MV Arte, na Feira PARTE, de 6 a 9 de Novembro.

Começava a década de 80 quando conheci aquele que viria a ser o meu mestre, o pintor Flávio Tavares. Generosidade sempre foi a marca do Flávio, ele abriu-me a porta do mundo, eu entrei, ele mostrou-me caminhos trilhados e disse-me: para o artista só o próprio caminho é válido. Flávio acreditou que eu poderia encontrar meu caminho, e estava certo. 

Nesta época, costumava visitar o professor Hermano José Guedes, levava minhas primeiras pinturas para dele ouvir algo que iluminasse o caminho. Numa ocasião, ele falou: o artista só começa a pintar depois dos cinquenta anos. Eu tinha pouco mais de dezoito, aquilo me pareceu absurdo. Hoje compreendo, assim como Flávio, Hermano também estava certo.

Eu dedico esta exposição a Flávio Tavares e a Hermano José Guedes, dois grandes mestres e amigos que me ensinaram ver que tudo está certo, como sempre esteve.

Sergio Lucena São Paulo, 08 de agosto de 2014. 


Horizonte comum

Júlia Lima 

“A pintura catalisa um estado”: é assim que Sérgio Lucena descreve sua prática artística. Estar frente a uma de suas telas torna-se uma experiência sensorial, mexe com o corpo, com a mente. É possível ser transportado para os mais distintos lugares, estados de espírito, de consciência. A cor, a luz e o volume da tinta envolvem o espectador numa atmosfera potencialmente subjetiva e transformadora, que oferece a possibilidade de mergulhar e envolver-se em si mesmo, e numa nova percepção da realidade. Enfrentar esse mergulho é paradoxal, pois ao mesmo tempo em que desperta lembranças e experiências passadas, também nos aponta ao novo e ao desconhecido.

Horizonte comum apresenta o percurso da produção de Sérgio Lucena, do início de 2004 até uma nova fase que se iniciou em 2012, atravessado por digressões que permitem conhecer amplamente os esforços do artista em seu constante enfrentamento com a pintura. Com algumas obras inéditas, a mostra investiga os diferentes espaços que o exercício artístico ocupa: seja a pulsão por esgotar as possibilidades da cor sobre a tela; sejam os desafios de criar luz a partir da tinta preta; seja a disputa sutil entre figuração e abstração presentes em momentos-chave de sua obra. Esses momentos são marcados pela dedicação exaustiva à temática da paisagem, buscando novos modos de olhar o mesmo cenário que encarava enquanto criança no Sertão da Paraíba. No entanto, seus interesses recentes vão mais longe e concentram-se na tentativa de compor atmosferas que imprimam no público um estado singular de consciência e presença.

Os trabalhos pictóricos do início de sua carreira – parte surrealistas, parte regionalistas, parte barrocos – traziam um universo fantástico e assombroso, povoado de animais míticos e rebuscados. No entanto, Lucena saltou, como num movimento pendular, do rebuscamento barroco ao extremo da pintura abstrata. É nesse momento em que passa a apurar a fatura e a técnica para elaborar imagens indiciais de paisagens e cenas marinhas, empregando uma outra palheta de cores, outra pincelada e ocupando-se, assim, de outro universo. Notável, no entanto, é o denominador comum a toda sua produção. Há uma luminosidade inerente a todo trabalho. O que sempre interessou ao artista não eram primeiramente as formas e as figuras, mas sim a cor e a luz. Natural que, com o esgotamento do expediente da ilustração e da narrativa, viesse o abandono da figuração. Logo mudaram seus procedimentos perante a tinta e a tela, em pinturas erguidas laboriosamente com infinitas sobreposições de camadas de tinta, na busca pela luminescência. É a partir de então que se revela o fascínio de Lucena pela matéria, não apenas pelo prazer palpável da lida com as tintas, mas também por uma ânsia alquímica de combinar elementos para alcançar um resultado quase mágico. Esse interesse pelo misticismo, antes presente na figuração, permeia agora as imagens misteriosas que cria.

As pinturas, assim, são intensos e rigorosos experimentos de um cientista da arte que, por meio do exercício repetitivo de aplicar e retirar tinta, oferece a possibilidade de experiência subjetiva. Sérgio ainda pinta como o menino no Sertão da Paraíba que subia em uma pedra e olhava para o mundo. Infinitas pedras, infinitos horizontes. 


 

4 setembro – 12 outubro 2014

Aberta ao público de terça a domingo, das 14 às 20h

Usina Cultural Energisa

Avenida Juarez Távora, 243 – Torre João Pessoa – PB

(83) 3221.6343 | 3221.4985

www.premioenergisaartesvisuais.com.br

www.premioenergisaartesvisuais.blogspot.com

www.sergiolucena.net

 


 

Trampo, amanhã, dia 24, grafita a fachada de um novo prédio vizinho à Galeria Tina Zappoli, aqui no Bairro Rio Branco. Parabéns João Carlos, assim com a Galeria, Trampo já tem dois grafittis em espaços privados do Bairro.

 


QUANDO: 05/09/2014 a 28/11/2014

ARTISTAS: ANETE RING, CABRAL, DIRCE KÖRBES, FELIPE CRETELLA, FERNANDA CHEMALE, FERNANDA VALADARES, IBERE CAMARGO, ITELVINO JAHN, JULIANA HOFFMANN, KLAUS MITTELDORF, LORENA HOLLANDER, MAGLIANI, MARINHO NETO, ROGER MONTEIRO e SERGIO LUCENA.


Ter uma opinião excessivamente positiva dos próprios feitos e qualidades pode ser armadilha, e o Livro do Eclesiastes, atravessado por debates dessa ordem, já no princípio anuncia: “Vaidade de vaidades, tudo é vaidade” (Ec, 1,2). Mais que um tema judaico-cristão, trata-se de um assunto de interesse moral, cujos desdobramentos nos lançam à própria condição humana, construída a partir de intensas negociações do homem com o sagrado, e do homem consigo mesmo, conhecer de suas múltiplas conquistas, mas também de seus limites. Nesse ínterim, o desejo de distinção, fama e reconhecimento assombra, e mesmo pensadores menos soberbos e mais reservados podem dever às voltas com uma conclusão como a de Gustave Flaubert (1821-1880), de que “[…] a vaidade é a base de tudo, e de que finalmente o que chamamos de consciência é apenas vaidade interior.”

Alquebrados, estamos de volta à provocação que motivou este pequeno texto: o ego mata. E mata o quê? Talvez o mais simples: a chance de olhar para o lado e perceber que o outro, com aquilo que lhe é próprio e singular, pode ser um continente, e que somos construídos pelo convívio e compreensão das diferenças e pluralidades.

Paula Ramos | Critica de arte, professora-pesquisadora do Instituto de Artes da UFRGS

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